Guerra e Paz
representam
sem dúvida o melhor trabalho que já fiz.
Dedico-os à humanidade.
(Portinari, 1957)
Foi no último dia de exposição gratuita
no salão nobre do Grand Palais, em
Paris, que conseguimos ver e apreciar as obras da coleção Guerra e Paz, de Cândido Portinari. Além dos painéis, a exposição
compreendeu os estudos e esboços do artista, além de um vídeo-documentário
sobre o processo de restauro (2010-2012), objetos pessoais e cartas.
Grand Palais (Paris)
|
Encomendada pelo Governo Vargas ao
pintor (1952), especialmente para ser presenteada à ONU em Nova York (1956),
esta coleção passou por dois fatos marcantes: o primeiro, movido pela opinião
pública e um grupo de intelectuais e artistas, que apelaram ao Itamaraty para
que os painéis fossem expostos no Brasil antes de ir para os EUA, a fim de que
o público brasileiro pudesse vê-los pela primeira e possivelmente última vez.
Assim, os painéis ficaram por poucos dias em 1956 à disposição do público, lotando
o Teatro Municipal do Rio de Janeiro dia e noite com estudantes, operários,
homens e mulheres.
O segundo fato foi o impedimento do
artista, pelas autoridades dos EUA, de ir à inauguração da sua própria obra na
ONU, em razão de sua ligação com o Partido Comunista do Brasil. Portinari faz a
crítica da Guerra e celebração da Paz, e a mantém aos olhos dos ‘senhores do
mundo e da guerra’, para lembrá-los que das suas decisões dependem a vida de milhões
de pessoas; ‘senhores’ cegos, que em nome de uma guerra, dita fria, fizeram
valer o seu capricho, impedindo o artista de ver sua grande obra no local a que se
destinava. Antes mesmo da inauguração, Portinari pôde sentir que a Arte
encontraria dificuldade em penetrar as mentes calculistas e gananciosas dos ‘senhores
da guerra’. A par disso, chamou a nossa atenção o fato de, mesmo assim, o
embaixador do Brasil estar na abertura e ‘representar’ o artista, limitando-se
a dizer no dia: “Com pesar não o
vejo hoje entre nós. Desejo salientar um ponto: o Brasil está oferecendo hoje
às Nações Unidas o que acredita ser o melhor que tem para dar”.
Limitados às vistas de delegados da ONU
desde 1956, em local não aberto ao público por razões de segurança, os painéis
puderam ser vistos novamente pelo público entre 2010 e 2014[i]
e agora estavam em Paris, devendo voltar ainda este ano aos EUA.
O pintor ficou 3 anos produzindo
esboços, desenhos e pinturas que depois ficariam eternizados nos dois painéis
da ONU. Alguns desses desenhos e pinturas também estavam presentes na exposição.
Mãe com seu filho morto (óleo sobre tela) |
Considerada obra-síntese do pintor, os grandes
painéis de Guerra e Paz retratam o
essencial de Portinari. No painel ‘guerra’ aparece o homem morto, a mãe
chorando com a criança morta, ambas inspiradas em obras anteriores d´Os Retirantes’;
não mostra armas ou tanques e sim pessoas em situação de extrema dor causada
pela guerra. No painel ‘paz’, podemos ver também os meninos com suas
brincadeiras. Sobretudo, Portinari nos mostra o ser humano em situações de drama,
ternura e solidariedade.
Detalhe do Painel 'Guerra' |
Apontado como um dos artistas mais importantes
do Brasil, Portinari enfim pôde ser visto e estudado por muitos brasileiros e
estrangeiros, pela obra que ele considerou ser a mais importante de sua vida.
A paz para Cândido Portinari é o cotidiano sem
ameaças do Estado. As mulheres em momentos de alegria, crianças com simples
brincadeiras de rua, em gangorras, cordas, balanços e danças. Crianças, sendo
crianças e não vítimas da guerra.
Crianças brincando (desenho-esboço) |
Fontes:
[i] Apresentada
em São Paulo, no Memorial da América Latina, de fevereiro a maio de 2012, foi
considerada a primeira exposição blockbuster de um artista brasileiro,
recebendo nos 90 dias em que esteve aberta ao público, cerca de 200 mil
pessoas. Eleita a Melhor Exposição de 2012 pela Associação Brasileira de
Críticos de Arte – ABCA e vencedora do Prêmio ABERJE 2012, a mostra foi também
indicada à Melhor Exposição em 2012 pelos jornais Folha de São Paulo e Estado
de São Paulo. Em 2013, a exposição seguiu para Belo Horizonte, marcando a
reinauguração do Cine Theatro Brasil Vallourec. Considerada pela Revista Veja
BH como a melhor exposição da temporada na cidade, foi visitada por mais de
80mil pessoas em 40 dias. Fonte: Jornal da Canastra.
Publicado no Portal Desacato, de Florianópolis e no Blumenews.
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