Capa do Livro (foto: reprodução) |
Esse livro chegou às minhas mãos pelo colega e amigo Nilton, que
instigou a minha curiosidade sobre a história dos agentes secretos infiltrados
por Cuba em organizações de extrema-direita nos Estados Unidos, especialmente
as anticastristas, a fim de evitar novos ataques patrocinados por estas
organizações contra a Ilha. É uma história real, mas com ‘peripécias dignas dos
melhores romances de espionagem’.
O
momento foi quando Cuba buscava minimizar a crise econômica através do
incentivo ao turismo, logo após a queda da União Soviética (1991), seu
principal parceiro comercial. É que, desde
1962, após a Revolução (1959), Cuba passou a sofrer embargo econômico imposto
pelos EUA, que também proíbe outros países que mantêm relações com os Estados
Unidos de estabelecerem relações comerciais com Cuba. O embargo é condenado
pelas Nações Unidas e até mesmo por tradicionais críticos do regime socialista
de Cuba.
O
jornalista Fernando Morais, munido de documentos, fotos, notícias de jornais e
relatos dos próprios protagonistas e testemunhas, nos mostra o outro lado da
história, aquele não divulgado pela mídia, como os 127 ataques terroristas
sofridos pelos cubanos na Ilha, com invasões do espaço aéreo para jogar pragas
nas lavouras cubanas e interferências nas transmissões da torre de controle do
aeroporto de Havana, além de atentados à bomba nos hotéis cubanos, a fim de afugentar
os turistas. Tudo patrocinado e realizado por dezenas de organizações de
extrema-direita sediadas nos Estados Unidos, mais precisamente em Miami.
O
livro também revela a participação de mercenários da América Central na participação
de ataques contra Cuba. Como exemplo, temos a história do salvadorenho Cruz
León, contratado pelas organizações anticastristas, e que por ser fã Sylvester
Stallone, envolveu-se nos ataques para viver aventuras semelhantes às
representadas por seu ídolo. Por isso, teria aceitado uma missão quase suicida:
colocar bombas em hotéis e num restaurante em Havana por US$ 1.500 cada uma. Segundo
o autor do livro, “Os mercenários centro-americanos não conheciam a situação
cubana, nem sabiam o que estava em questão”. Ao contar sua história ao autor do livro, Cruz
León explicou o que o moveu a ajudar os anticastristas: “Eu ia pôr bombas num
país que nem sabia qual era, voltaria para casa e iria para a cama com a Sharon
Stone. Me senti um espião. Me senti o máximo”. Acabou descoberto e condenado à
morte em Cuba, mas depois teve sua pena substituída por 30 anos de prisão.
Desse
exemplo, podemos constatar a força da propaganda política dos filmes norte-americanos,
principalmente sobre a guerra do Vietnã. São filmes aparentemente ‘tolos’ e ‘inocentes’,
mas que durante décadas construíram a opinião pública contra o Vietnã, Coréia e
mais recentemente o Iraque e Afeganistão. Estes filmes, além de fazer com que
cidadãos americanos tivessem uma opinião favorável à manutenção da caríssima
política de guerra sustentada por seus governantes, ludibriaram espectadores de
outros países, como Cruz Léon, especialmente aqueles que os EUA exerciam
influência política, econômica e cultural, financiando governos militares e
ditatoriais como na América Latina e diversos países do continente Africano. Interessante
seria saber quem financiou estes filmes, e não nos espantaria se a indústria de
armas e afins constasse entre os patrocinadores, ainda que indiretamente. Essa
mesma propaganda política é feita contra Cuba, por meio dos seriados policiais
ambientados em Miami, mas principalmente pela mídia estadunidense, copiada e
repetida pela mídia brasileira.
Apesar
das várias reclamações oficiais de Cuba aos EUA sobre os atentados sofridos,
inclusive em carta entregue em mãos por Gabriel Garcia Marquez a Bill Clinton,
nenhuma medida foi tomada a fim de evitar novos ataques, nem mesmo pelas
organizações internacionais. Diante disso, é que Cuba decidiu criar a Rede
Vespa, um grupo de agentes de inteligência cubanos que teve como missão se
infiltrar nessas organizações a fim de antecipar a informação de novos ataques
à Ilha, evitando que os mesmos acontecessem. Os espiões conseguiram, assim,
impedir uma série de ataques, até que foram pegos pelo FBI, em 1998.
Um dos agentes designados para se infiltrar nas organizações anticastristas,
na Flórida, a fim de antecipar informações para evitar novos ataques à Cuba. |
Cinco
agentes da Rede Vespa foram condenados em Miami por conspiração para espionar,
conspiração para assassinar, entre outros, num julgamento cuja condução foi
alvo de muitas críticas internacionais. A Anistia Internacional também criticou
o tratamento prisional dado aos cubanos, como a proibição de visita das esposas
de dois dos agentes. Oito vencedores do Prêmio Nobel já escreveram uma carta
para o Procurador Geral dos EUA pedindo a liberdade para os cinco cubanos,
dentre eles José Saramago.
Esse
livro também nos faz refletir sobre os motivos que levaram e ainda levam os EUA
a manter o cruel embargo econômico contra Cuba. E um deles certamente não é a
luta pela democracia, eis que esse mesmo país defendeu e bancou a cruel ditadura
de Fulgêncio Batista em Cuba, patrocinou o regime militar no Brasil e muitas outras
ditaduras ao redor do globo.
Sim,
muitas violências foram cometidas pelo regime cubano, inclusive algumas são
mencionadas no livro. Mas o que dizer das imposições incutidas dia a dia pela
mídia, plantando concepções políticas muitas vezes baseadas em fatos dissociados
da realidade, tudo em nome do capital voraz, que nos vê apenas como
consumidores e não seres humanos; que nos vê como cidadãos servis e autômatos; que
só vale o ter, em detrimento do ser e saber?
* Os Últimos Soldados da Guerra Fria, de
Fernando Morais (Companhia das Letras, 2011).
* Esse artigo foi publicado no Portal Blumenews, de Blumenau.
* Esse artigo foi publicado no Portal Blumenews, de Blumenau.
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