Na
última vez que estive em São
Paulo (abril/2013) , quando fizemos uma entrevista com Elza Lôbo*, ex-presa
política durante o regime militar, conhecemos também o seu colega de trabalho Luiz,
motorista da secretaria estadual de saúde de SP, que faz uns ‘bicos’ nos fins
de semana, para complementar o orçamento de casa. Naquele fim de semana, ele
trabalhou com D. Elza, para dirigir o carro dela e ajudar nos trajetos que
faríamos do Hotel – Casa D. Elza – PUC/SP, Convento dos Dominicanos, Memorial
da Resistência (extinto DEOPS) e Cinemateca.
Entre
um trajeto e outro, foi possível conversar bastante com o sr. Luiz. Ele nos surpreendeu ao contar que foi
menino de rua, porque o pai ele não conheceu e a mãe faleceu quando tinha 8
anos. Em sua companhia, as movimentadas e barulhentas ruas de São Paulo transformavam-se
em referências de sua história de menino de rua. E, ao passar por uma frondosa
árvore ao caminho do Ibirapuera, nos contou que gostava muito dela, pois quando
criança dormiu muitas vezes embaixo de sua copa, protegido do sereno ou chuva,
em camas feitas com papelão e, nas noites mais frias, o papelão recolhido nas
ruas transformava-se em improvisadas cabanas. Vendeu muita bala e chiclete nos
semáforos de São Paulo. Apanhou da polícia. Aos 16 anos, uma senhora o acolheu:
a partir daí tinha casa, comida e seu compromisso era estudar. Depois de uns
anos, passou no concurso público para o cargo de motorista do estado de São
Paulo, onde está até hoje.
O
que mais chamou atenção na sua história foi quando nos contou da apreensão que
teve quando um dos filhos entrou para os quadros da Polícia Militar de São
Paulo. A partir daí, iniciou uma verdadeira cruzada para tirá-lo de lá. Convenceu
o filho a montar um pequeno negócio para trabalhar nas horas de folga, com o dinheiro
que economizou a duras penas – ‘simulou’ uma sociedade com o filho, contando
pra nós com um sorriso de gente vivida, de gente que sabia que naquele momento
não poderia bater de frente com o filho, mas sim deixar a vida ensinar. Com o tempo, a truculência do meio policial e
o com crescimento do negócio, o filho abandonou a polícia. Feliz da vida, nos
disse: ‘Eu consegui. Eu tirei o meu filho da Polícia!’
Vocês
tinham que ver o orgulho e a alegria vibrante na voz e nos olhos daquele homem.
De forma simples, o sr. Luiz nos ensinou que é sempre possível construir outros
caminhos. Sempre é possível ir contra o fascismo de Estado. Ali eu entendi,
quase tudo. Sobre poder, Estado e polícia.
Polícia atirando balas de borracha em manifestantes
sentados,
(foto: reprodução)
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Policial usa spray de pimenta contra cinegrafista
durante protesto
(foto: reprodução)
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Repórter do jornal Folha de S. Paulo atingida
no olho por uma bala de borracha
(foto: Diego Zanchetta/AE)
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* Esse artigo foi publicado no Portal Desacato, de Florianópolis e no Portal Blumenews, de Blumenau.
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